Por Fábio Kielberman*
A tecnologia digital e suas múltiplas possibilidades seguem avançando, rompendo paradigmas e mudando a cultura de fazer negócios e operações. No mercado corporativo e até na área financeira, nas quais o uso da tecnologia blockchain esteve associado, por um bom tempo, às criptomoedas, e consequentemente ao risco que elas poderiam representar, vemos agora uma mudança de posição, com outros setores econômicos aderindo à tokenização de ativos e ao uso da blockchain em aplicações diversas.
Até pouco tempo atrás, imaginar um produtor rural comprar um café e pagá-lo com grãos de milho “tokenizados” seria futurístico demais. Mas, isto aconteceu em uma loja da Starbucks, em Buenos Aires. A operação foi noticiada na Argentina pelas empresas envolvidas no projeto, e no Brasil, pelo jornal Valor Econômico, e destaca uma solução que transforma os grãos em um ativo digital. Nela, os produtores rurais convertem o valor de sua produção em criptoativos por meio da rede blockchain. Cada token equivale a uma tonelada de grãos entregues pelo produtor a um armazém. A partir daí, eles podem usá-los com cartão, em qualquer estabelecimento que opere com a bandeira Visa.
Para pagar o café na Starbucks, o produtor argentino só precisou utilizar o aplicativo no smartphone, com leitura do QR Code e blockchain. Mas os criptoativos podem ser utilizados de outras formas, serem trocados por sementes, veículos, máquinas, combustíveis, serviços ou mesmo dados como garantia.
Na Argentina, a solução foi resultado de uma parceria realizada entre a Agrotoken (empresa de infraestrutura global de tokenização de commodities agrícolas) e a Visa, com a participação de uma empresa de infraestrutura blockchain descentralizada (Algorand) e de uma processadora de pagamentos (Pomelo). Como resultado da parceria, foi lançado um cartão digital (ou físico) que combina o mundo dos criptoativos à agricultura, digitalizando o valor dos grãos, em uma operação assegurada pela tecnologia blockchain. Ou seja, a solução permite utilizar os criptoativos lastreados em grãos como forma de pagamento em qualquer lugar do mundo que aceite a bandeira Visa. A adesão da bandeira, inclusive, à solução, é um sinalizador de confiança no uso de tokens e blockchain.
Olhando o mercado de meios de pagamento, os cartões digitais já vinham avançado rapidamente, com um número cada vez maior de usuários fazendo pagamentos na web por meio de cartões virtuais de uso único, ou sob o impulso de empresas que agregam novas funcionalidades às suas carteiras digitais que só se tornaram possíveis graças à segurança da tokenização. Mas o modelo de tokenização de ativos com uso de blockchain abre todo um mundo de novas possibilidades, ao transformá-los em ativos digitais, que podem ser transacionados de acordo com o interesse do seu proprietário.
No agronegócio, que já vem incorporando inúmeras tecnologias às suas operações, este é outro fato disruptivo e que ilustra o processo de digitalização e transformação do setor. No Brasil, cooperativas agrícolas — entre empresas e instituições de outros setores – já vêm se beneficiando da blockchain ao realizarem leilões online (de imóveis, veículos, máquinas e equipamentos, entre outros ativos) por meio do ecossistema da Bomvalor, cuja atuação está ancorada na tecnologia.
A blockchain se assemelha a um cartório digital, registrando as operações no momento que ocorrem, de forma perene, transparente e segura, permitindo que todos os envolvidos na operação acompanhem e tenham acesso a esse registro digital, sem o risco de que ele se perca ou seja alterado. Trata-se também de uma transformação no segmento de leilões, tradicionalmente conhecido pelos certames presenciais, mas que avançou e segue crescendo para o modelo online, agora com os benefícios que esta tecnologia pode propiciar.
Não resta dúvida de que o avanço da blockchain é inexorável, e que, agora, é apenas uma questão de mudança de uma cultura arraigada nos modelos tradicionais e analógicos.
* Fábio Kielberman é CEO da rede Bomvalor
Fonte: Nando Rodrigues