Na Argentina, onde a soja ajuda a conduzir a economia, uma guerra envolvendo os impostos sobre as exportações está levando agricultores a defender suas plantações à noite, em meio a acusações de que eles estariam estocando a produção para enfraquecer o governo.
Em questão está o uso crescente de sacos de armazenagem, que têm 3,7 metros de diâmetro, 61 metros de comprimento e podem comportar mais de 300 toneladas de grãos ou sementes usadas na fabricação de óleos por três anos.
Alguns agricultores afirmam que usam os sacos apenas para armazenar suas produções até sua colocação no mercado, enquanto outros os veem como um tipo de conta poupança. O governo afirma que os agricultores estão estocando suas colheitas para não ter de pagar o controvertido imposto de exportação de 35% que sustenta um terço dos gastos do Estado.
A briga verbal, já perto das eleições presidenciais de outubro, ficou mais virulenta nos últimos meses. Agora, segundo os agricultores, ela também envolve invasões noturnas que culminam na abertura e inutilização dos sacos de armazenagem.
“O uso dos sacos de armazenagem não é uma escolha, é uma necessidade”, diz Gabriel De Rademaker, vice-presidente da Confederação Rural Argentina. “O governo controla as licenças de exportação de alguns grãos e a falta de infraestrutura significa que às vezes é preciso esperar semanas pelos caminhões que vêm pegar a produção.”
A Argentina é o terceiro país no ranking dos exportadores de soja em grão e lidera a lista no caso do óleo de soja e derivativos do mundo. Os agricultores afirmam não saber quem está por trás dos ataques aos sacos de armazenagem, mas está claro para eles que o conflito tem conotações políticas. Uma pichação em um muro de Oliva, ao norte de Buenos Aires, diz: “Seja patriota, destrua um saco de armazenagem”.
No último ano, houve 30 ataques a sacos de armazenagem, segundo o jornal “La Nación”. A Província de Córdoba começará a usar drones para tentar coibir os ataques, conforme a Secretaria da Agricultura local.
A presidente Cristina Kirchner já entrou em choque com os agricultores depois que assumiu o poder em 2007, quando se movimentou para elevar o imposto de exportação para 45%. Isso levou a 129 dias de greves, estradas bloqueadas e falta de alimentos em todo o país, um conflito que acabou em julho de 2008, quando o vice-presidente Julio Cobos votou contra o aumento do imposto.
Os agricultores afirmam que o atual imposto de 35% torna suas operações não lucrativas e dá a eles um incentivo para esperar até depois das eleições, quando a perspectiva de um novo governo poderá resultar em novas políticas comerciais e uma taxa de câmbio melhor.
Mauricio Macri e Sergio Massa, candidatos à Presidência que fazem oposição ao atual governo, já disseram que vão reduzir os impostos à exportação para promover os investimentos. Daniel Scioli, o candidato mais próximo da atual administração, não tem comentado políticas agrícolas.
Em 2014, os agricultores argentinos usaram os sacos de armazenagem para guardar um recorde de 10 milhões de toneladas. Eles passaram a estocar mais sobretudo depois que a cotação da soja no mercado futuro recuou 13% em um ano, tornando mais difícil para o país refazer as reservas necessárias para pagar sua dívida e as importações.
O governo estima que os agricultores estão estocando 18% da última safra recorde de soja de 53,4 milhões de toneladas métricas, ou cerca de US$ 3,7 bilhões em sementes para a produção de óleo. O chefe de gabinete Jorge Capitanich disse em 15 de janeiro que os agricultores estão enfraquecendo os financiamentos governamentais ao partirem para a estocagem.
Nas sete primeiras semanas do ano, eles exportaram US$ 1,8 bilhão em grãos, menor valor para o período desde 2007. Em 2014, foram US$ 24,1 bilhões em grãos e sementes para a produção de óleos, para reforçar as reservas do Banco Central.
O Morgan Stanley está prevendo outra safra recorde de soja na Argentina de 57,8 milhões de toneladas na atual safra, que será colhida a partir de abril. Em 1º de janeiro o estatal Banco de la Nación Argentina cortou os financiamentos a agricultores que estão estocando soja – o que, para Capitanich, foi uma decisão “racional”.
Por: Pablo Gonzalez | Bloomberg