Os pesquisadores Teresa Capell e Paul Christou da Universidade de Lleida, na Espanha, obtiveram um meio viável de produzir o anticorpo 2G12, proteína que neutraliza o vírus da Aids. Eles desenvolveram um arroz transgênico que contém a molécula anti-HIV em seu DNA e, desse modo, a reproduz em larga escala e de maneira economicamente viável. Isso faz desse arroz uma possível biofábrica da molécula e já despertou interesse da indústria farmacêutica.
O trabalho de pesquisa foi divulgado no dia 7 de abril na revista Plant Biotechnology Journal . “Trata-se da mais importante publicação científica da área de Biologia após as revistas Science e Nature,” afirma o pesquisador Elíbio Leopoldo Rech, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF) que participou da pesquisa.
Rech explica que os trabalhos foram coordenados pelos pesquisadores da Universidade de Lleida, na Espanha, e que a participação brasileira consistiu na análise do arroz modificado e na mensuração da quantidade da proteína 2G12 presente nele. “Trata-se de um sinal da qualidade da pesquisa brasileira, uma vez que os resultados do trabalho foram analisados somente pela equipe da Embrapa”, orgulha-se Rech. Esses trabalhos analíticos foram realizados por meio de métodos de espectrometria de massa executados pelo pesquisador André Melro Murad, da mesma Unidade da Embrapa.
“Utilizamos espectrômetros de massa de última geração para avaliar a composição do arroz,” conta Murad. Além da quantidade da molécula, ele também avaliou a estrutura proteica do arroz geneticamente modificado em comparação ao arroz convencional. O pesquisador da Embrapa encontrou teores do anticorpo 2G12 entre 1,8% e 2,4%. Elíbio Rech explica que são valores positivos. “Acima de 1% podemos considerar a potencial viabilidade econômica da produção dessa molécula,” diz.
O método
Para utilizar o arroz como biofábrica da proteína, os pesquisadores utilizaram como vetor a bactéria patogênica Agrobacterium tumefaciens. Nesse método, a bactéria é trabalhada geneticamente, dela é extraído um gene nocivo e em seu lugar é colocada a molécula que se deseja reproduzir. Depois de multiplicada em laboratório, a bactéria é inserida para contaminar um tecido da planta. Nessa contaminação a bactéria insere seu DNA na planta, com a molécula desejada. A partir desse tecido são geradas novas plantas que irão conter a molécula.
Arte: Raul Silva
A utilização dessas plantas como biofábricas para a produção em larga escala do anticorpo 2G12 tem como objetivo final o desenvolvimento de um gel com propriedades viricidas para que as mulheres apliquem na vagina antes do relacionamento sexual. Para concretizar esta etapa, a parceria com indústrias farmacêuticas é fundamental.
Soja como Biofábrica
A equipe liderada por Rech obteve resultado semelhante ao reproduzir a proteína cianovirina, também usada no combate à Aids. Nesse caso, a equipe da Embrapa, em parceria com a Universidade de Brasília (UnB) utilizou a soja como biofábrica para a produção da molécula.
A pesquisa foi publicada em fevereiro na revista Science .
Nesse trabalho, os brasileiros utilizaram outro método para introduzir a molécula no DNA da planta, chamado biobalística. O processo consiste na utilização de microprojéteis de ouro ou tungstênio acelerados a altas velocidades – superiores a 1.500 km/h – para introduzir, via bombardeamento, o DNA de interesse em células e tecidos in vivo.
Arte: Raul Silva
A utilização de plantas, animais e microrganismos geneticamente modificados para produção de medicamentos faz parte de uma plataforma tecnológica com a qual o pesquisador vem trabalhando desde a década de 1990. “As biofábricas ou fábricas biológicas são capazes de expressar moléculas de alto valor agregado com custos baixos e, por isso, são opções viáveis para produção de insumos, como medicamentos e fibras de interesse da indústria, entre outros”, afirma Rech.
O cientista faz questão de ressaltar que as sementes geneticamente modificadas de arroz não serão plantadas no campo. Elas serão cultivadas em condições controladas de contenção dentro de casas de vegetação ou estufas.
A Aids no mundo
Mais de 35 milhões de pessoas em todo o mundo vivem atualmente com o vírus da Aids, o HIV, segundo dados do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS). A maioria da população infectada vive na África Subsaariana, onde a doença causou mais de 1,8 milhão de mortes em 2012. Apesar de o número de mortes causadas por Aids ter diminuído ao longo dos últimos anos devido à implantação de medicamentos antirretrovirais, o vírus continua a se espalhar, pois não há vacinas eficazes e a prevenção continua dependendo de ações de baixa adesão como métodos de barreira ou abstinência.
Medicamentos microbicidas que contêm antirretrovirais ou anticorpos neutralizantes do HIV podem ser potencialmente utilizados para prevenir a transmissão do vírus, desde que a sua produção e fornecimento sejam em quantidades suficientes para proteger a população em situação de risco.
Irene Santana (MTb 11.354/DF)
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia